sábado, 12 de novembro de 2011

Cassetête-à-tête



Fácil, fácil é estabelecer o tête-à-tête. Um burro fala, o outro abaixa a orelha. Um ditado muito conhecido pelo Brasil e duramente ditado também por ele, desde os tempos modernos dos anos de chumbo. Essa é a sublime ordem arbitrária que fomenta o progresso reverenciado na bandeira do nosso país.
O infortúnio dos Xavantes que, em forçosa aclamação à história imperialista do Brasil, se transformam na Rua Xavantes do Conjunto Anhanguera, bairro da região sudeste de Goiânia, também é o infortúnio de quem sofre por não se submeter à calada da madrugada escura do dia 8 de novembro de 2011.
O “é proibido fumar”, de Roberto Carlos, já entoava, em 1964, os sons da balbúrdia que seria armada em 2011, desde o dia 27 de outubro, com a prisão de três estudantes da USP, por simplesmente fumarem. Foi só o começo. O cerco todo já se armara com o acordo que o magnífico reitor João Grandino Rodas, outrora, assinara com a PM, a fim de estabelecer rondas ordeiras na Cidade Universitária. O circo pegou fogo, mas o fogo só chamuscou de leve na cobertura da imprensa, que tratou do assunto serena e calmamente, com a paz e a benção do governador do Estado de São Paulo Geraldo Alckmin e seu subalterno Rodas.
Gostamos sempre de reavivar memórias. Do contrário as esqueceríamos, como sempre nos esquecemos de recapitular os giros passados dos Rodas da vida. É válido lembrar que, entre 1995 e 2002, com a soberba do poderio, Grandino Rodas integrou a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos. Com o poder nas mãos, ele pôde apurar sobre a morte de militantes políticos do período da Ditadura Militar, dentre eles o filho da estilista Zuzu Angel. Como era de se esperar, ele inocentou os militares responsáveis por “preservar vidas e aplicar a lei”. Digno de quem de grande só tem o despotismo nos tempos do cólera.
Não é de ver que o atual reitor da USP também tentou “privatizar” o espaço público da universidade, que, aliás, deveria ser o universo de todos. Pois bem, quando administrou a Faculdade de Direito, o despotinha tentou implantar catracas no prédio da instituição, mas só para evitar estranhos, nada demais. E tudo isso sem consultar nem o corpo burocrático da Faculdade, tampouco os estudantes, é claro. É... Parece que quem precisa de “ter aula de democracia, de respeito ao dinheiro público e ao patrimônio público” não somos nós, os estudantes, não é mesmo, Alckmin?!
Essa tendência arbitrária é o derradeiro amor de quem tem o poder e de quem pactua com o poder para alcançá-lo. O Estado que dignifica e institui a força em prol da repressão é o mesmo que profere o grito da democracia e fala em nome de um país democrático. Balela.
A guerra que deveria ser contra a demagogia da política do porrete é contra os estudantes e encapuzados que pedem pela liberdade destoada pela ameaçadora e repressiva presença militar no âmbito acadêmico do diálogo e da construção do saber. A polícia, que deveria dar segurança, apresenta suas armas com escudos, cassetetes, capacetes reluzentes e reprime. É assim que Estado e militarismo mantêm-se invictos e amistosos, graças à política do tête-à-tête.